sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A ESCOLA E A NEGAÇÃO DO CORPO E DA SEXUALIDADE DA CRIANÇA

Tão importante quanto o aprendizado da leitura e da escrita do mundo, é saber ler a si mesmo e escrever sua história, conhecer o seu corpo, suas possibilidade e potencialidades, pois assim como adquirimos conhecimentos para transformar o mundo num lugar melhor, devemos conhecer nossa sexualidade para tornamos melhor o nosso mundo interno, o nosso corpo e nossa mente, que são o berço das significações da vida. Por isso, nossa defesa de que a Educação Sexual escolar supere sua abordagem sobre sexualidade pautada meramente nas noções biológicas, ou seja, no aprendizado da anatomia do corpo humano, seus órgãos e funções.
Esta visão reducionista e genitalista da sexualidade consolida a visão da sexualidade mercantilista que reduz o corpo a um objeto, um produto, desumanizando das relações afetivo-sexuais. Como já apontamos, os conhecimentos biológicos também são necessários e importantes, mas não suficientes para a compreensão da totalidade da sexualidade, sendo assim, a Educação Sexual escolar, precisa, além da vertente corporal e de saúde preventiva, contribuir à formação de valores éticos e estéticos e para a crítica da forma banal, mercantilista e quantitativa que a sexualidade tem sido vivida nos dias de hoje.
A escola nega o corpo da criança, enxerga como se ela fosse apenas uma cabecinha, aberta a ser um depósito, como na concepção de educação bancária de Paulo Freire, onde serão depositadas as informações, os conteúdos programáticos. A criança é impedida de suas manifestações corporais, até mesmo as manifestações fisiológicas são contraladas, impedindo e estabelecendo horários para que a criança por exemplo, possa ir ao banheiro. Até mesmo, o levantar da carteira durante a aula é considerado muitas vezes como indisciplina.
A escola quase sempre exclui o corpo da mente, separa, mutila. Apenas a cabeça tem que ficar na sala de aula, o corpo só na aula de educação física. Sempre dual, separado. Não conseguindo entender a totalidade do ser. Somos inteireza e não partes estanques, somos razão e subjetividade, somos seres biológicos e histórico-culturais. É no ambiente escolar, no contexto dessa tradição racionalista, que se desenvolve a noção de uma educação intelectual separada de uma educação corporal ou física sendo que ambas, destinando-se a dimensões consideradas opostas e inconciliáveis, ao serem justapostas - educação corporal e educação intelectual  –  compondo a chamada educação integral. Ainda consolida a visão cultural de gênero, separando meninas e meninas, impedido que se socializem, que se reconheçam igualmente como seres humanos.
Consideramos como Louro (1999, p.21) que a criança no ambiente escolar é impedida de expressar-se na sua totalidade seja criativamente, verbalmente ou gestualmente, surgindo o que Louro chama de “corpo escolarizado” ou “corpo disciplinado pela escola”. Disciplinado para o silêncio e dentro de um modelo pré-determinado de fala: “mãos, olhos e ouvidos estão adestrados para tarefas intelectuais, mas possivelmente desatentos ou desajeitados para outras tantas”.
Uma educação autoritária, disciplinadora e de certa forma negando as manifestações corporais da criança, podem provocar um desequilíbrio da sensação somática o que afetará  a autoconfiança e a unidade do sentimento do corpo da criança, que para  controlar seus afetos, vão desde então, enrijecendo o corpo através de sua educação, assim a criança é impedida de desenvolver seus movimentos naturais das crianças através das inibições impostas à elas, causando distúrbios na pulsação biológica, pois como forma de amenizar os sentimentos  de angústia, a criança acaba por interromper o ritmo normal na respiração, tensionando o abdômen.
Segundo Shaw e D’angour (2001, p. 59) “essas reações são uma forma de o corpo preparar-se para lutar, paralisar a atividade ou fugir”.     Assim, nas reações frente as diferentes circunstâncias autoritáras e medo, “[...] temos a tendência de contrair os músculos de nosso pescoço involuntariamente, fazendo com que a cabeça lance-se para trás. As reações musculares que acompanham este reflexo incluem levantar os ombros, tensionar os braços, enrijecer o tórax e flexionar os músculos das pernas para que nossos joelhos fiquem firmes”; 
Como aponta Reich (1992, p.60), “é prendendo a respiração que as crianças costumam lutar contra os estados de angústia, contínuos e torturantes, que sentem no alto do abdômen ou nos genitais e têm medo dessas sensações”, formando desde a infância o que Reich denomina de couraça rígida, que impede o movimento ondulante do peitoral, bloqueando a respiração, como forma de anulação das sensações fortes seja, de  prazer ou  angústia, o que Reich (l992), aponta como sendo o mecanismo básico da neurose. Pois, ao perder este bloqueio respiratório, deixa seqüelas, que acabam também por causar um bloqueio da criatividade e espontaneidade da criança. 
A Educação Sexual que queremos pauta-se numa abordagem que não negue as manisfestações corporais da criança, pois nossa sexualidade se desenvolve desde que nascemos, por isso a necessidade de desenvolver a consciência corporal desde a infância para que a criança entenda a sexualidade de maneira saudável, prazerosa, bonita, natural e essencial em nossa vida.
Defendemos uma educação sexual que busque fornecer ao ser humano as ferramentas necessárias para que possa conhecer seu próprio corpo, o corpo do outro e compreender sua sexualidade para que possa por si mesmo ser capaz de realizar escolhas afetivo-sexuais. Precisamos nos reeducar para superar a visão do corpo objeto de aprendizagem, pela visão corpo como sujeito de aprendizagem. Consideramos como Moreira (1995, p. 22), a necessidade do "olhar sensivelmente os corpos [...] até porque o ato de conhecer não é mental como marca; ele é antes de tudo corpóreo.Todo conhecimento inclusive o de si mesmo, passa pelo corpo, como afima Merleau Ponty, "[...]toda consciência é consciência perceptiva, mesmo a consciência de nós mesmos. "
Mas porque tantos professores sentem  dificuldade em lidar com as manifestações da sexualidade das crianças? E como a escola pode contribuir para melhorar a consciência corporal e o desenvolvimento da sexualidade?
Bem essa questão fica para um próximo post, até lá!

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